Este é o texto da exposição coletiva de gravuras dos alunos formandos do curso de Gravura da Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, realizada no Memorial Municipal Getúlio Vargas, RJ, de 27/11/22 a 05/02/23. Apresenta um recorte da produção desses jovens artistas focalizado na gravura em metal e seus desdobramentos, disciplina ministrada por mim, que fiz a curadoria da mostra. Sinto-me duplamente honrada por ter me graduado na mesma instituição na qual hoje ensino Gravura em Metal e por ter contribuído para a formação desta nova geração.
“Os artistas apresentados nessa mostra são formandos de 2022 do curso de Gravura da Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Como alunos passaram pelo isolamento exigido pela pandemia de Coronavírus e pela experiência das aulas remotas, e têm em suas contas os ônus e os bônus desses fatos. Para um artista de gravura, acostumado ao coletivo, o trabalho longe do ambiente dinâmico do ateliê teve impacto pessoal, emocional e profissional, uma vez que, em geral, os artistas não dispõem individualmente da pesada estrutura de ateliê: o espaço físico, equipamentos e produtos químicos. Em contrapartida, receberam um reforço em teoria e história da gravura para as suas elaborações conceituais e o enriquecimento de seus repertórios gráficos pelos esforços de uma produção artística domiciliar adaptada a materiais alternativos. Fizeram suas próprias pontas secas e gravaram em suportes não convencionais como embalagens de tetrapak, pvc e papelões. Com o fim da quarentena, no retorno ao ateliê, essas experiências se conjugaram às técnicas tradicionais da gravação em côncavo, como o talho doce, maneira negra, água forte, água tinta e outras, abrindo o campo gráfico, sempre em expansão. A ampliação de possibilidades materiais e técnicas produziu alargamentos e aprofundamentos poéticos, cujos resultados veremos nas obras expostas.
Ana Clara Lemos tece, através de cenas aparentemente banais, versos líricos em hachuras sutis, como recortes dos momentos fugidios do cotidiano, descobrindo a poesia escondida sob a efemeridade.
As linhas sinuosas de Cecília Abreu oscilam entre o aquático e o etéreo e, quando formam figuras, são evocações texturadas de perguntas silenciosas diante das vidas anônimas transformadas em números.
Para lidar com o distanciamento do individual e os transtornos, Flórez se apropria do imaginário do tarot, valendo-se da antinomia do oráculo, um sistema coletivo e aberto revelador do mistério e do secreto individual.
As gravuras de Felipe Klen são como fotogramas, quadros de filmes de animação cujas cenas, personagens e paisagens parecem ter saído de histórias orientais, de grafismos e tonalidades delicadas e exóticas.
Gutz Grilla cria uma nova mitologia com personagens híbridos saídos de um tempo circular, mesclando o antigo monstruoso com uma estética pós-moderna para, desta maneira, lidar com profundas questões humanas através do humor e da fantasia.
A arquitetura fantástica de Juliana Nobre se projeta nos espaços das possibilidades, a criatividade como resposta à precariedade, a adaptabilidade como uma metáfora da reinvenção da vida na sobrevivência.
Através da figuração de animais, em tênues e sensíveis gradações tonais, Livia Coelho cria narrativas visuais que remetem às fábulas e aos contos maravilhosos.
Luiane Amorim é, em sua gravura, pura tradução dos afetos: seus embates com as técnicas incidem numa poética que se materializa a partir das suas relações com o outro e consigo mesma.
A poética de Má Ferreira se funda na síntese, na busca filosófica do essencial. As figuras de seu imaginário funcionam como elementos compositivos ou modulares, parte de uma pesquisa gráfica que transita entre signo e símbolo.
Otto Drummond mergulha nos fundamentos da gravura partidário de um grafismo vigoroso, que testa os limites que a materialidade impõe ao gesto na pesquisa da expressividade das possibilidades gráficas.
A série Unboxing parte da observação de Patrícia Pedrosa de comportamentos que se configuraram durante a pandemia do coronavírus desenvolvendo-se numa poética que incorpora embalagens com suporte de gravuras.
Tainá Verde encontra nas transferências de fios e tramas físicos para a gravura em metal os argumentos visuais de suas criações, emaranhamentos que sugerem micélios, filamentos e ramificações, indícios de vida.”